Desço as escadas do meu prédio, como sempre faço. Estou prestes a ir em frente em busca de cortinas para o nosso apartamento que está com todos os móveis entulhados e coberto por lonas, piso empapelado e pó por todos os lados. Três pintores lixam e lixam ao som de "Esse cara sou eu!" E eu lá, no meio de toda aquela empolgação. Não levei muito tempo para decidir que "a tarde é uma criança" e que devo sair. Há alguns anos vi uma cortina no consultório da minha terapeuta e me encantei com o acabamento. Perguntei de onde era e ela me falou de um lugar chamado Novo Stillo. Escondido, pelo que me lembro, atrás da Praça do Rosário, e é para lá que me dirijo. Assim que chego sou recebida por um senhor de fala baixa. Nesse momento, a única voz que escuto e entendo é a minha.
- Gostaria de ver cortinas para minha casa.
Ele mal abre um sorriso, garantindo-me que este não foi o pedido mais extravagante que ouviu esta tarde.
- A senhora tem idéia do que quer?
- Sim. Passo para ele todas as informações possíveis. Como se eu soubesse mais sobre as cortinas do que sobre mim mesma.
Ele prossegue me mostrando e explicando sobre cada detalhe dos materiais e da montagem. Estou encantada.
Há quanto tempo o senhor trabalha nesta área? Pergunto. Imediatamente faço um esforço imenso para escutá-lo e entendê-lo
Agora sim, ele abre um grande sorriso e diz:
- Tem pouco tempo. Desde 1964. Diz em voz muito baixa.
Penso comigo mesmo: "Será que estou ficando surda?"
Vejo que ele se entusiasma e eu também ao ouvi-lo contar como foi o início de seu trabalho e quem eram seus concorrentes. Sorriu novamente ao falar que já não existia nenhum deles. Deixava-me totalmente concentrada na história sobre o que se usava na época e o que voltou à moda hoje em dia. Finalmente eu conseguia escutá-lo. Acho que ele descontraiu com a conversa e soltou a voz. Eu gostava daquele som. Eu gostava de ouvi-lo. Parecia outra pessoa e não aquela que me atendeu logo que cheguei. Falei com ele sobre o meu trabalho. Apartir daí a conversa parecia não ter fim. Eu sabia o suficiente sobre as minhas cortinas, na verdade, o que estendeu o nosso assunto foi à volta do que já se usou um dia.
Ele disse: - Tudo voltou, menos as cortinas de renda.
- O senhor está enganado. Afirmei.
Falei sobre a volta dessas cortinas, a volta das cortinas de veludo, dos tecidos adamascados e dos florais. Percebo sua expressão de surpresa e dúvida ao mesmo tempo.
Minha visita durou mais do que o esperado. Acho que falei demais. Sinto que preciso ir.
De volta ao lado de fora, sob o sol, respiro fundo e faço o caminho rumo à minha casa. Imagino que, a esta altura, os pintores devem estar terminando o seu turno. De volta ao pó.
Imagens: Lizzonet
James Hare
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3 comentários:
Hummmmm como sou suspeita, eu amo tudo que é antigo, eu amo os móveis, as louças, a moda e lógico as cortinas .....estou literalmente no século errado .....quero muito voltar a minha época ...rssss
Amei todas ...mas aquela bordadinha de flores .....QUE LINDA !!!!!
Que bom que o velho, agora é novo, adorei a sua tarde de Junho ! bjs, bjs
Sou eu que faço as minhas, reconheço que cortinas, tapetes e almofadas juntando com luz indireta faz toda uma mudança em qualquer ambiente, seu post me inspiro já que estou nesta fase de mudar as de minha casa.
Delícia de história! Assim que deveria ser sempre! Prazer, orgulho do que faz e amor! Só com muito amor pra fazer cortinas desde 1964! E viva a renda que está de volta!
Bjs
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